"Nem Londres, nem Somália" - Por Paulo José de Oliveira ao Jornal O VALE
Paulo José de Oliveira - Membro da Irmandade dos Mártires da Caminhada Latino-Americana (Equipe de Comunicação das CEBs da Diocese de São José dos Campos)
Paulo José de Oliveira - Membro da Irmandade dos Mártires da Caminhada Latino-Americana (Equipe de Comunicação das CEBs da Diocese de São José dos Campos)
Estamos assistindo pela mídia mundial acontecimentos que marcam realidades totalmente diferentes do caminho que pode levar à construção do Reino de Deus, trazido por Jesus Cristo. São realidades que mostram os extremos existentes no modelo de organização da nossa sociedade globalizada. Por um lado vemos conflitos e mortes dentro de uma realidade de pobreza, miséria, exclusão, ausência total de dignidade humana. Por outro, vemos também conflitos e mortes dentro de núcleos de países desenvolvidos, mas onde também não se desenvolveu o respeito, a partilha, a igualdade, a solidariedade, a justiça.
No primeiro extremo acompanhamos o que vem ocorrendo em países africanos, como a Somália, onde milhares de pessoas, crianças e adultos, morrem abandonadas sem qualquer possibilidade de a- cesso ao mínimo necessário para se ter vida, na sua essência básica, que é o alimento para o corpo. Aproximadamente 29 mil crianças menores de cinco anos morreram de fome em três meses na Somália, segundo o Centro de Controle e Prevenção de Do-enças dos EUA.
Muitos são os responsáveis por estas mortes: grupos internos em conflito pelo poder político, países como os EUA, com suas políticas intervencionistas e anti-terror, e organismos internacionais humanitários que não se credenciam como imparciais, e desta forma são impedidos do acesso às áreas dos desabrigados. Na verdade, as pessoas pobres, de países pobres, morrem por que elas não interessam ao modelo de produção econômico neoliberal globalizado, porque não produzem a "mais-valia", nem consomem. Não fazem parte do "mercado", e por isso podem morrer!
Como cristãos, não podemos ficar apenas na análise econômica e social. Temos de "perceber a radicalidade que está em jogo na questão da pobreza: a vida e a morte de pessoas", pessoas criadas à imagem e semelhança do seu Criador, o Deus da Vida. Não podemos ficar indiferentes, sobretudo porque nós, latino-americanos, vivemos também em uma sociedade de muitas exclusões e dívidas sociais.
No outro extremo, assistimos também, pela imprensa internacional, aos distúrbios e conflitos ocorridos em Londres. Trata-se de uma comunidade inserida em um centro representativo do desenvolvimento econômico europeu. Enquanto a renda "per capta" na Somália fica na casa dos US$ 600, na Inglaterra ultrapassa US$ 35.000.
Mas se há essa riqueza material na Inglaterra, por que os conflitos e distúrbios de agosto de 2011? O sociólogo português Boaventura de Souza Santos, em artigo publicado no jornal Folha de S. Paulo, afirma que "os motins na Inglaterra são um perturbador sinal dos tempos". Diz também que nossas sociedades estão produzindo um "combustível altamente inflamável", um combustível composto pela promoção da "desigualdade social, do individualismo, da mercantilização da vida, da prática do racismo, e do sequestro da democracia por elites privilegiadas". E afirma ainda que "os distúrbios na Inglaterra começaram com uma dimensão racial" e que o que acontece em Londres é uma "denúncia política violenta de um modelo social e político que tem recursos para resgatar bancos e não os tem para resgatar a juventude de uma vida sem esperança."
Desta forma, como cristãos, podemos ter a certeza que nem a realidade da Somália, nem a sociedade individualista promovida pelos sistemas econômicos fratricidas, fazem parte dos caminhos do Reino de Deus.
Grande Abraço, Rafa, obrigado pelo carinho e amizade. Paulinho
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